Quero que ela pouse devagar no meu joelho, joelho deve ser bom de receber ferrão, depois a abelhinha se morrendo num vôo tonto – será que elas sabem que vão morrer? Quero que ela pique e morra bem assustada do meu lado, incrédula, pensando que devia ter ficado em casa fazendo mel como toda abelha devia fazer – deve ser isso que pensam as mulheres quando percebem que estão morrendo no parto e não têm nenhum zangão pra chorar por elas. Deviam ter ficado em casa, a vida toda em casa fazendo mel.
Quero uma porta de madeira branca, um urso de isopor com purpurina com meu nome pendurado. Quero que alguém abra essa porta e me lave e me tire dali dizendo que posso começar tudo, tenho sete anos pra aprender a ler, mais oito pra aprender a falar as coisas certas e outros três ou quatro pra aprender a resistir, ferroadas nos joelhos. Quero que alguém me tire pela porta branca e me dê um beijo na testa pequena e me troque a fralda cantando uma canção que não seja de terror, quero dormir sonhando com o arco-íris que meu irmão prometia, um pote gigante de gomas vermelhas na outra ponta, sempre na outra ponta.
Quero um mapa gigante dos meus últimos anos, quero alguém que aponte, alguém que crave uma lança no ponto exato onde eu me perdi de mim. Alguém que explique quando foi que a Alice saiu do meu corpo e sumiu pra sempre numa toca escura com o coelho neurótico, e me esqueceu sem cor e sem graça lendo livros enfadonhos sobre gente que não me interessa. Quero saber, quero saber por onde é que eu ando há tantos anos que me aperto e não sinto, quero os ferrões, as abelhas, o meu pote de jujubas de cereja do outro lado do arco-íris, quero a minha mãe fazendo mel na cozinha de casa ao invés de morrendo pra fazer uma filha que talvez nem saiba amá-la, faz tempo que eu não sei amar. Não acho mais graça na páscoa e nos seus chocolates, quero de volta os meus líquidos – minha saliva, meu choro, meu tesão, meu suor nas noites de festa.
Quero saber quem foi que eu piquei, em que joelho maldito eu deixei a minha força, o meu brilho, a vontade de levantar da cama e correr até o pote de balas – ou quem sabe se já não piquei o útero e cheguei azeda no mundo, moribunda, frouxa, vendo as pessoas na velocidade delas e sentindo preguiça de sorrir, às vezes ódio dos solícitos que seguram portas e eu tenho de olhar e agradecer.
Quero fechar os olhos e entender, de repente perceber o que é que está errado, um jogo dos sete erros: desvendo e faço o último círculo e levanto e saio de casa de camisola e chinelos cumprimentando vizinhos e começando tudo de novo atrás das jujubas vermelhas no arco-íris. Quero sentir uma dor aguda de um ferrão nos joelhos e perceber seja o que for que eu não percebo há anos, ver a abelhinha tontear e silenciar o zumbido ameaçador até cair bêbada, inofensiva.
Mas ela foi embora, voando, e eu não sinto nada.
Quero uma porta de madeira branca, um urso de isopor com purpurina com meu nome pendurado. Quero que alguém abra essa porta e me lave e me tire dali dizendo que posso começar tudo, tenho sete anos pra aprender a ler, mais oito pra aprender a falar as coisas certas e outros três ou quatro pra aprender a resistir, ferroadas nos joelhos. Quero que alguém me tire pela porta branca e me dê um beijo na testa pequena e me troque a fralda cantando uma canção que não seja de terror, quero dormir sonhando com o arco-íris que meu irmão prometia, um pote gigante de gomas vermelhas na outra ponta, sempre na outra ponta.
Quero um mapa gigante dos meus últimos anos, quero alguém que aponte, alguém que crave uma lança no ponto exato onde eu me perdi de mim. Alguém que explique quando foi que a Alice saiu do meu corpo e sumiu pra sempre numa toca escura com o coelho neurótico, e me esqueceu sem cor e sem graça lendo livros enfadonhos sobre gente que não me interessa. Quero saber, quero saber por onde é que eu ando há tantos anos que me aperto e não sinto, quero os ferrões, as abelhas, o meu pote de jujubas de cereja do outro lado do arco-íris, quero a minha mãe fazendo mel na cozinha de casa ao invés de morrendo pra fazer uma filha que talvez nem saiba amá-la, faz tempo que eu não sei amar. Não acho mais graça na páscoa e nos seus chocolates, quero de volta os meus líquidos – minha saliva, meu choro, meu tesão, meu suor nas noites de festa.
Quero saber quem foi que eu piquei, em que joelho maldito eu deixei a minha força, o meu brilho, a vontade de levantar da cama e correr até o pote de balas – ou quem sabe se já não piquei o útero e cheguei azeda no mundo, moribunda, frouxa, vendo as pessoas na velocidade delas e sentindo preguiça de sorrir, às vezes ódio dos solícitos que seguram portas e eu tenho de olhar e agradecer.
Quero fechar os olhos e entender, de repente perceber o que é que está errado, um jogo dos sete erros: desvendo e faço o último círculo e levanto e saio de casa de camisola e chinelos cumprimentando vizinhos e começando tudo de novo atrás das jujubas vermelhas no arco-íris. Quero sentir uma dor aguda de um ferrão nos joelhos e perceber seja o que for que eu não percebo há anos, ver a abelhinha tontear e silenciar o zumbido ameaçador até cair bêbada, inofensiva.
Mas ela foi embora, voando, e eu não sinto nada.
Um comentário:
faz zunzun e mel... adorei!
Postar um comentário