quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Sou


Sou a minha oscilação exaustiva de hormônios

Sou o gráfico trágico da minha comunicação ovariana,

a resposta depressiva do meu útero vazio.

Sou os meus cistos gigantes,

sou o estouro ardido desses meus líquidos indevidos,

o retorcer doído de um sistema inábil.

Sou o fraquejar esquisito de uma coluna angulosa,

sou curvilínea.

Sou a dor perene na contração dos músculos,

na constipação do ventre,

no pulsar insistente das paredes da cabeça.

Sou a minha irritação pré-menstrual,

meu desamparo,

meu inchaço dolorido.

Sou o meu acúmulo nos quadris,

minhas varizes,

minhas estrias se esticando brancas

na minha existência imensa:

sou minhas trombadas nas portas,

nos bancos dos ônibus,

minhas cabeçadas nesses tetos baixos,

nessas escolhas fatais.

Sou minha fome excessiva,

minha dependência.

Sou minha cesárea às pressas

Meus cortes, rasgos, costuras

o-s-t-e-o-p-o-r-o-s-e

Sou a minha menopausa ardilosa,

que me tolhe os anseios

e me murcha a boca.

Sou meus calores sufocantes

Sou minha transpiração humilhante sobre o rímel preto,

minha insônia incansável:

sou meus olhos secos abertos no tictac insistente dessas noites quentes

Frias

Quentes

Sou a minha oscilação exaustiva de hormônios

Sou o gráfico íngreme da minha comunicação ovariana,

a resposta depressiva do meu útero vazio.

E escondo tudo num preto básico

Em taças de vinho

Em bases, corretivos, colares

Em saltos altos firmes

Em saltos.

E assim, no espelho do elevador,

No corredor, celular, casamento, hospital, enterro, restaurante, escritório, mercado, creche, motel, bar, livraria, avenida, fórum, ônibus, maternidade, eventos, consultas, teatros,

nos faróis

Sou um aceno breve

Sou tudo-bem-e-você.