quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Resumo de uma Quarta Qualquer


Muito triste, amor, vem aqui, faz passar, me faz feliz?
Como? – meio distraído, qualquer coisa colorida que se mexe na tela.
Não sei, faz alguma coisa, faz passar. (trecho pós censura familar -- parentes internautas!)
Metrô. Trabalho. Computador ON, quatro horas, Computador OFF — um dos meninos presos fazia aniversário justo hoje, podia já ter sido solto mas faltava a minha manifestação —
Celular com sinal no metrô, é preciso aproveitar cada segundo:
Lindo adivinha só já estou chegando, me encontra na esquina da augusta com a paulista na frente do
Não, preciso fazer cocô.
Ele cocô e banho e eu livraria — comprei mais um livro para adiar minhas leituras obrigatórias.
Oi, amor, que livro é esse?
Não sei, gostei e comprei, sobre um cara que queria ser escritor quando jovem e não virou nada.
Um lanche light no barulho da Augusta
Uma professora da faculdade no cine sesc, e uma outra figura bizarra que sempre encontramos
— e o velho clichê são-paulo-pequena-não-a-renda-que-é-concentrada —
Um filme de contos eróticos da idade média — ele ri daquele jeito dele que me dá uma vergonha carinhosa.
Subimos a ladeira e chego arfante porque subi falando, a gente fala demais.
Um ônibus até o outro cinema e reclamo do bilhete único que acaba muito rápido, saldo R$ 0,25
— ele inspeciona minha carteira à procura de um ímã que esteja desmagnetizando o cartão —
Ele paga menos no ingresso porque o total dá treze e eu só tinha uma nota de dez.
Amor, pra quê a caixinha dos óculos escuros agora?
Tinha dinheiro, da praia...
Esse dinheiro era meu! (risos — rs rs?) então me compra uma água, vai.
Nossa, que água cara.
Um filme lindo, abraço e aperto a mão dele toda vez que o casal sofre — ele cochicha promessas de amor pra me acalmar, diz que não vai ser chato como o homem do filme, e eu achando uma graça o homem do filme.
"A angústia do futuro diminui a felicidade do presente", ou algo do gênero, o filme diz que é um provérbio de um povo que não consigo lembrar. Nem ele.
Tão bonito!
Você também, linda.
Não você, o filme! você também...
Tomar algo antes do último ônibus?
Naquele bar que não existe!
Descemos a ladeira, o bar existe mas é um inferno, futebol ligado, todos de pé. Saímos? Saímos.
Subimos a ladeira, Estamos fechando, Só vinte minutos, Estamos fechando.
Quatro bares lotados, sentamos no último, cardápio cheio de cervejas, muitos homens vendo futebol.
É que hoje é quarta-feira!
Bosta.
Gritos, muitos gritos, algum gol maldito, os homens se deslocam para ver de perto, estamos cercados de sovacos palmeirenses.
E se a gente mudasse de bar?, Futebol em todos, Vamos no Black Dog tomar um suco.
Ah não, fila pra comprar, de pé.
Então vamos só namorar no ponto de ônibus esperando o meu Jardim Miriam, vai demorar mesmo.
Estamos chegando no ponto, ofereço uma bala de melancia porque quero dar um beijo enorme na boca.
Amor!! o Jardim Miriam ali, o que eu faço??
Ele corre chamando o ônibus, eu imagino que ele vai entrar e dizer surpresa-vou-dormir-na-sua-casa.
Uns segundos sem jeito, eu ainda segurando a minha bala, um tapinha rápido nas costas, um tchau-amor!
Um olhar cinematográfico pela janelinha, a cobradora está dormindo na minha frente.
Lembro com prazer que o bilhete único de adulto dura três horas, débito R$ 00,00.
Essas coisas me dão muito prazer.
Olho de novo a janelinha mas ele já vai, listrado, paulista afora, não vai lembrar das três horas do bilhete e vai voltar a pé só pra economizar R$ 2,30 — até agora não sei se chegou são e salvo. Não sabemos.
Ligo o MP3 na pasta Triste porque acho que estou no clima, The Last Time I saw Richard, na versão do Renato Russo pra combinar com a noite mal-acabada.
Ponho a bala de melancia melada na boca.
Justo o Jardim Miriam, que sempre demora tanto pra passar.
Chego em casa louca pra escrever esse dia, por algum motivo sei que vou lembrá-lo pra sempre.
Pra sempre. Os bares frustrantes, o ônibus prematuro, o gosto de melancia, o beijo que não deu tempo.
—isso sim é um beijo roubado —
Quero correr para o computador e escrever tudo.
Mas chego em casa e tem primeiro o cachorro com sua felicidade, e meu pai escovando os dentes e perguntando se o filme era bom, e minha mãe querendo saber algum detalhe bobo do meu dia que nem coube neste resumo.
Não tem problema, eu lembro cada segundo.
Computador finalmente e ainda o gosto de melancia.
Vou lembrar pra sempre.

Justo o Jardim Miriam, que sempre demora tanto pra passar!
Vou ligar pra ver se ele chegou bem.